Um belo dia, eles chegam. E mudam tudo: as nossas rotinas, os nossos rumos, as nossas prioridades. Um turbilhão de mudanças acontecem quando eles entram em nossa casa, em nosso ninho, em nossa vida.
Passamos a viver em função deles. Deixamos de fazer o que fazíamos. Abrimos mão de sonhos, projetos, convicções. Renunciamos. Abdicamos. Entramos num processo de metamorfose de sentimentos, pensamentos, valores e metas.
Eles chegam, tomam conta do ambiente e provocam um verdadeiro rebuliço de idéias e emoções. A cada passo, a cada fase, uma nova experiência. A gente sofre, chora, luta, ri, conquista, aprende junto com eles. Não dá para separar as vivências, não dá para ignorar as ausências.
E um belo dia, eles saem. E mais uma vez, um tsunami de emoções acontecem em nossos corações. Nós que construímos nossas vidas em função das vidas deles sentimos os pés sem chão e o vazio da despedida diária nos faz refletir sobre a dinâmica da vida.
Um dia, eu fiz assim com os meus pais. Fui saindo, aos poucos, a cada gesto, a cada escolha, a cada novo projeto. A cada nova paixão, nossas prioridades mudam e os pais que nos elegeram como prioridade máxima de suas vidas são colocados em segundo, terceiro, quarto plano.
Quando assim o fiz, não o percebi. Segui o curso natural da vida. Apaixonei-me, casei-me, constituí uma família. Tive, pela graça de Deus uma única filha linda, saudável e inteligente. Quando saí da casa de meus pais nem por um momento pensei em quais eram os sentimentos deles. Simplesmente, fiz minhas escolhas.
Mas, agora, encontro-me do lado oposto. Agora, o que eu não percebi me angustia, me machuca, me inquieta, me faz parar, pensar, analisar e refletir. A minha filha está indo. A minha única filha. Esse detalhe potencializa ainda mais o que eu e meu esposo estamos sentindo nos últimos dias.
Meu bebê que nos próximos meses completa 21 anos de existência pela graça do bom Deus percebe esse meu “falatório” como drama. Para ela, eu e o pai olhamos as suas atitudes através de lentes de aumento. Não consegue perceber o que sentimos. Eu também não percebi. E ela só irá perceber quando enxergar por outro ângulo, por outro foco, pela percepção que tenho hoje.
Um dia, eles se vão. E ela, a minha pequena está indo. Aos poucos, como um dia eu fui. Assim são os filhos. Criamos e educamos para a vida e não para nós. Na teoria, esse é um conceito perfeitamente aceitável, na prática é uma realidade dolorida.
Difícil dizer adeus a cada novo namorado que surge, a cada nova paixão, a cada nova amizade. Sentimo-nos como que trocados, inúteis, substituíveis. Posso até estar exagerando, mas é o que sinto, o que vivo nesse momento ímpar de desapego forçado.
Não estou lavando as mãos como fez Pilatos. Não! Da minha filha, eu não desisto. Ela permanece e sempre permanecerá na minha vida como uma pérola encravada na ostra. Saiu de dentro de mim, mas não sai do meu coração.
Quem lê este desabafo pode não estar entendendo se está na posição de filho(a) que descobre, conquista, escolhe, decide e vai. Mas, quando você estiver, arrumando as malas ou acenando na janela vai entender. É o que os psicólogos chamam de a síndrome do ninho vazio. Os pais, uns mais cedo, outros mais tarde vivem esse momento.
Olhamos para trás e custa entender porque as nossas prioridades não são as deles. Os filhos vão deixando a nossa vida aos poucos, quando vemos estamos como no início: à espera da chegada deles.
Um dia, eles chegam. Um dia, eles vão. Essas palavras não são de mágoa, amargura, ressentimento. São um desabafo. Uma reflexão. Um aprendizado na vida de uma mãe que percebe a cada dia, a saída da filha.
É a vida! Que Deus abençoe mais e mais a minha pequena que vai saindo do ninho devagarzinho, alçando vôos mais altos, trilhando caminhos mais longos e construindo o próprio percurso. Que essa experiência que não é única sirva de reflexão para pais e filhos. O imperceptível hoje é marcante no amanhã. Tudo é uma questão de posição, de foco, de visão.
Pais: curtam seus filhos agora, aproveitem todos os momentos. Filhos: valorizem todo o aprendizado com seus pais, cada momento. Tudo na vida passa. Ficam as lembranças e a consciência do dever cumprido.